O início desse blog, marca a lembrança de um tempo remoto, um tempo de 1996, que eu tinha mas não tinha mais a minha mãe. Foram dias a fio, com ela viva, mas ela longe de mim, da minha casa, da minha irmã, mas muito perto do meu pai, mesmo sem que ela soubesse que ele estava ao lado dela. Ela estava lá, lá no CTI, daquele hospital, onde meu avó também tinha ido e nunca mais voltado. Onde a minha irmã tinha ido, mas tinha voltado. Era uma dúvida, será que ela ia voltar? Ou não? Enfim, fui duas vezes lá. A primeira vez, foi horrível, ela estava lá, não sabia que eu estava lá. Mas eu a vi, ela ali no CTI, deitada, inerte, muitos aparelhos ligados, uma cor horrível. Uma cena muito ruim. Vi meu pai, ele não era o mesmo mais, ele estava mais magro, mais velho, mas ainda estava vivo e podia falar comigo. E viu o meu desespero. Passei o resto do dia com ele no hospital, depois ele veio pra casa comigo. Alguns dias depois minha mãe foi para o quarto, foi a vez que voltei e a minha irmã também. Mãe estava muito magra, um cabelo feio, não tinha forças para andar, se locomovia com muita dificuldade. Alegrou-se demais em me ver e ver minha irmã, mas ela não parecia mais a minha mãe. Era distante, era como se ela tivesse parado no tempo e eu e a minha irmã não. Foi um nó na garganta vê-la. Mas passei o dia lá. Mais uma vez a minha irmã foi embora e eu fiquei com meu pai. Conheci algumas pessoas que meu pai fez amizade no hospital e no fim do dia vim pra casa, mas não consigo me lembrar como que voltei. Alguns dias passaram, e o telefone da nossa casa tocou, era cedinho, era hora de ir pra aula, e era a minha mãe, ela saiu do quarto e foi ligar pra mim e pra minha irmã. Ali nasceu uma esperança enorme, ela vai voltar, tudo vai ficar bem. Mas esse dia nunca chegava. Um dia me surpreendi meu pai me pegou do nada na casa de uma amiga, na época, eu vivia lá, já que na minha casa as coisas já não tinham tanta graça. O médico mandara meu pai embora e pediu que ficasse com a família, pois aquele podia ser o ultimo dia da minha mãe. Entretanto não foi. Mais alguns dias se passaram e realmente chegou o dia, meu pai dormia em casa, e o telefone tocou, era madrugada, a hora não me lembro mais, dei um pulo da cama quando meu pai abriu a minha porta, já sabia o que era, ele não precisava me falar. Minha irmã também foi acordada. Meu pai se foi para resolver as coisas, e eu e minha irmã ficamos em casa, em pouco tempo nossa casa estava tomada pelos nossos amigos do colégio, que eram nossos amigos de infância, os amigos dos meus pais, que eram nossos tios emprestados, e ai começou o luto. Só me levaram para o cemitério depois do almoço, eu estava apática, não me lembro bem do que estava acontecendo, sei que minhas amigas estavam lá, estavam do meu lado. Enfim, cheguei no cemitério, fui pra a área do velório, não consegui olhar pro meu pai direito, ele estava na beira do caixão, chorando muito, abraçando a minha mãe, queria que eu e minha irmã fizéssemos o mesmo. Mas não fizemos. Era nosso "primeiro" velório, não tínhamos ido no do meu avô. Era tudo muito estranho, só lembro que o pescoço da minha mãe estava torto. Um detalhe, eu e a minha irmã que escolhemos a roupa que nossa mãe seria enterrada, que coisa horrível né? Não me lembro do que senti naquele momento, acho que ainda estava alheia a tudo aquilo. Passei grande parte do velório do lado de fora, ou dentro da parte de repouso, sempre com meus amigos. Não sei se fiz o certo, mas fiquei longe daquela cena que não entendia e não queria aceitar. ,Quando fechou o caixão e íamos pro enterro, não foi nada bom, foi a pá de cal em tudo o fim de tudo. Segui ao lado do meu pai e da minha irmã até o fim, aquele realmente era o fim. E hoje é uma data próxima a esse dia. Tudo terminou no dia 05/06/1996, que data feia. Hoje, me escondi, escondi de mim mesma. Meus amigos e amigas que me perdoem. Não dei conta. Escrever esse post foi dolorido, chorei, mas era necessário, senti vontade. É a vida vencendo o luto ou o luto se fazendo presente na luta da vida.
